Decisão Crucial: Corte Constitucional Italiana Mantém Cidadania 'Iure Sanguinis' e Aponta para o Parlamento
7/31/20254 min read


Um veredito muito aguardado sobre o futuro da cidadania italiana por direito de sangue (iure sanguinis) foi proferido. Em uma decisão histórica, a Corte Constitucional Italiana, na Sentença nº 142/2025, depositada em 31 de julho de 2025, rejeitou os questionamentos que buscavam limitar a transmissão da cidadania por descendência. A decisão, no entanto, não encerra o debate, mas o redireciona para a arena política: o Parlamento.
Iremos analisar em detalhes o que foi decidido e o que isso significa para os descendentes de italianos em todo o mundo.
O Cenário: A Dúvida Levada à Corte
A questão chegou à mais alta corte da Itália por meio de ordens de remessa de tribunais de primeira instância em Bolonha, Roma, Milão e Florença. Esses tribunais estavam julgando casos de requerentes, muitos deles nascidos e residentes no Brasil e no Uruguai, que buscavam o reconhecimento da cidadania com base em ancestrais italianos que emigraram há várias gerações.
A dúvida central era se a regra atual, que permite a transmissão da cidadania por filiação sem qualquer limite de gerações ou a exigência de um "vínculo efetivo" com a Itália, seria compatível com a Constituição.
Os Argumentos no Banco dos Réus: Por que Limitar?
Os tribunais que levantaram a questão apresentaram argumentos robustos, refletindo um debate crescente na Itália:
Soberania e o Conceito de "Povo": O principal argumento era que a inclusão de milhões de descendentes sem conexão real com a vida social e política do país diluiria o conceito de "povo", ao qual a Constituição atribui a soberania;
Falta de Razoabilidade: Consideraram desproporcional e irracional que a cidadania fosse concedida apenas pelo laço de sangue, ignorando a ausência completa de integração ou participação na comunidade nacional;
Conflito com o Direito Internacional e Europeu: Apontaram que a prática italiana poderia violar o Art. 117 da Constituição, que vincula o país a obrigações internacionais e da União Europeia. Argumentaram que essas normas exigiriam um "vínculo genuíno" para a cidadania, especialmente porque a cidadania italiana confere automaticamente a cidadania europeia e direitos como a livre circulação;
Tratamento Desigual: Por fim, alegaram uma disparidade de tratamento injustificada em comparação com outras vias de aquisição de cidadania, como o casamento, que exigem provas de integração, como o conhecimento da língua italiana.
A Palavra Final da Corte: A Sentença 142/2025
Após analisar todos os pontos, a Corte Constitucional tomou uma decisão dividida em duas partes principais.
1. Questões Inadmissíveis: "Não é Tarefa da Justiça"
A maioria das contestações, e as mais importantes, foram declaradas inadmissíveis. A Corte não chegou a analisar o mérito desses pontos pelo seguinte motivo: respeito à separação de poderes.
Segundo a Corte, a definição dos modos de aquisição da cidadania é uma matéria de ampla discricionariedade do Legislador. Os tribunais estavam pedindo à Justiça que criasse um novo sistema complexo, escolhendo entre múltiplas opções: impor um limite de duas ou três gerações? Exigir proficiência na língua? Comprovação de residência?
Realizar tal intervenção "manipulativa" e de sistema não é função do Poder Judiciário, mas sim uma prerrogativa exclusiva do Parlamento. Em outras palavras, a Corte disse que não pode atuar como legisladora.
2. Questões Infundadas: "As Situações Não São Iguais"
As questões que alegavam tratamento desigual em relação a outras formas de cidadania foram analisadas no mérito, mas consideradas infundadas.
A Corte argumentou que, para haver violação do princípio da igualdade, as situações comparadas precisam ser substancialmente idênticas. E, neste caso, não são:
A aquisição da cidadania por ser filho de um cidadão (que nunca perdeu o status) é uma situação diferente daquela de um descendente de alguém que perdeu a cidadania
Da mesma forma, o vínculo de filiação (iure sanguinis) é fundamentalmente diferente do vínculo matrimonial, não sendo possível compará-los para fins de igualdade de tratamento.
Efeitos Práticos: O Que Isso Significa para os Requerentes?
Status Quo Mantido: Para os milhares de processos de reconhecimento de cidadania em andamento, a decisão traz alívio. A regra tradicional, sem limites geracionais, foi mantida pela Corte para os casos em julgamento;
Foco no Parlamento: A decisão deixa claro que o campo de batalha para qualquer futura alteração nas regras da cidadania é o Congresso Italiano. A pressão por mudanças agora se concentrará totalmente na esfera política;
A Nova Lei de 2025: A Corte mencionou o Decreto-Lei nº 36 de 2025, que de fato introduziu limites à cidadania iure sanguinis. No entanto, a própria sentença esclarece que as novas regras se aplicam apenas aos processos iniciados após a sua vigência, não afetando os casos anteriores a 27 de março de 2025, como os que originaram a decisão.
Conclusão: Um Ponto Final ou Apenas uma Vírgula no Debate?
A Sentença 142/2025 não foi a "revolução" que alguns esperavam, nem a "validação" definitiva que outros desejavam. Foi uma decisão técnica e sóbria, que reafirmou o papel de cada poder na República Italiana. A Corte não disse que a lei atual é perfeita ou imutável, mas sim que não cabe a ela mudá-la.
Para os descendentes de italianos, o caminho judicial para o reconhecimento com base nas regras antigas permanece aberto para os processos já iniciados. Contudo, o futuro da cidadania iure sanguinis para as próximas gerações será decidido não nos tribunais, mas nas casas legislativas de Roma. O debate está longe de terminar.